quarta-feira, 28 de abril de 2010

Sobre Chaplin e Chespirito

Sim meus caros leitores, eu queria muito ter ido até o Mart Center em São Paulo para acompanhar a segunda edição do Festival da Boa Vizinhança. Durante estes dias em que Kiko e Seu Barriga y Pesado estiveram no Brasil me vi pensando a respeito do quanto El Chavo Del Ocho me acompanhou durante todos esses anos. Eu nasci em 1989, e naquela época o programa já não era produzido e as reprises ecoavam piadas e jargões em toda a América Latina.

Mas o que justifica o sucesso de um seriado como Chaves? Sem grandes recursos, com cenário pobre e personagens caricatos - além, é claro, de episódios que se repetem e repetem e repetem... Nem os próprios atores presentes no Festival conseguiram dar uma resposta certa que explicasse o sucesso. Quando criança, minha mente era povoada de questões como: Será que eles ainda estão vivos? Aconteceu realmente um acidente de avião (lenda antiga)? Qual é a verdadeira voz dos personagens? (...) Meus primeiros passos no mundo internético (com conexão discada) me permitiram acessar ao site da Televisa, onde eu encontrei algumas informações sobre o programa.

Cão arrependido, mamãe querida, seu Madruga carpinteiro, professor Girafales apaixonado entre outros episódios marcaram minha infância, adolescência e ainda hoje, em tempos de YouTube, já perdi muito tempo revendo cenas de episódios. Mas hoje, é claro, sites como chespiritobr.com ajudam os fanáticos pelo seriado a encontrar, entre muitas coisas, episódios perdidos.


Minha explicação para o sucesso de Chaves? Talvez a ingenuidade, o humor fácil. Não é o tipo de programa que assistindo pela primeira vez leva a gargalhadas - mas após acompanhar os passos marcados, como o tapa dado por D. Florinda ou a pancada no Seu Barriga, tudo fica mais divertido. Além disso, eu somaria a genialidade daquele que é conhecido no México como pequeno Shakespeare, ou Chespirito. Roberto Bolaños, criador da série, é uma mente ativa até os dias de hoje, escrevendo programas, novelas e peças de teatro.


Ao lado do faminto Chaves, a pobreza também foi aliada do humor nos trabalhos de Charles Chaplin. Eu estava ainda no ensino médio, quando encontrei na locadora - na sessão "Clássicos" - filmes de Chaplin (em VHS). Tempos Modernos, O Garoto e O Grande Ditador marcaram minha adolescência, e foi nesta época que eu me propus a leitura da biografia do diretor/ator lançada pela editora Globo.

Foi depois desta leitura que eu passei a ver tudo em ângulos diferentes. Para muitos, a arte não deve ser analisada a partir da vida do artista, mas é evidente que ninguém produz arte sem ter alguma referência com seu contexto. Eu nunca fui um estudioso desta área, mas acredito que se existe uma separação entre vida e obra, essa separação é muito tênue.

E é justamente essa relação entre a vida e a obra de Chaplin que o psicanalista americano Stephen Weissman estudou para escrever o livro "Chaplin - Uma Vida". Hoje pela manhã, eu me deparei com uma entrevista com o psicanalista no ESTADÃO, que me deixou com mais vontade ainda de comprar o livro. O cerne de tudo é a infância sofrida de Chaplin, separado da família e assolado pela pobreza. Os traumas, as lembranças, tudo possui relação com o filmografia em questão.


Para mim, Chaplin e Chespirito compõem o quadro daqueles artistas que se eternizam e sobrevivem à enxurrada de produtos efêmeros da atualidade. Precisamos de mais artistas assim - e talvez teremos a família reunida, como eu pude presenciar inúmeras vezes: avós, pais e filhos na sala, rindo do que já viram outras muitas vezes e se emocionando com olhares e gestos mudos... tudo isso paradoxalmente inserido no contexto da "novidade" e "da comunicação verbal exacerbada" veiculada nos meios de comunicação.


Trecho da entrevista do psicanalista ao ESTADÃO:

O livro, escrito em forma narrativa, é baseado em extensa pesquisa sobre a vida pessoal de Chaplin. De onde surgiu tamanho interesse?

Mesmo hoje em favelas do Rio, nos bairros de Los Angeles ou nas favelas de Mumbai e Soweto, há crianças emocionalmente resistentes como Charlie Chaplin. Como psicanalista, me emociono e fascino pela histórias de crianças carentes incrivelmente dotadas que, de alguma maneira, conseguem sobreviver às adversidades, evitando o papel de vítimas e crescendo para se tornar adultos de sucesso, que conquistam o que querem. Criado em meio a uma pobreza dickensiana no fim do século 19, Chaplin perdeu a mãe para a loucura e o pai para o alcoolismo. Às vezes dormia nas ruas e, com fome, buscava comida na lata do lixo. Durante um período de 18 meses que passou em um orfanato, quando tinha 7 anos, Charlie lidou com seu medo e solidão interpretando papéis em um mundo de fantasia no qual ele já era "o maior ator do mundo". Escrevi o livro para tentar descobrir como uma criança de imaginação incrível conseguiu levar à vida adulta e adaptar a ela aquele sonho acordado da infância. Chaplin literalmente foi da pobreza ao status de mais famoso ser humano de todo o mundo. Ou, como um resenhista do livro colocou, "Chaplin não era apenas grande, era gigantesco. Em 1915, ele irrompeu em um mundo marcado pela guerra oferecendo o dom da comédia, do riso e do alívio. Ao longo dos próximos 25 anos, durante a Grande Depressão e a ascensão de Hitler, continuou seu trabalho. É difícil que outro indivíduo tenha dado tanto entretenimento, prazer e alívio para os homens quando eles mais precisaram".


3 comentários:

  1. Semana passada passou no Ratinho (sim, eu assisti) um especial sobre o seriado com a presença do Quico. Quase chorei, sério. Acho que mesmo daqui 20 anos, assistir o programa nos trará as mesmas sensações da infância. Não é qualquer um que consegue isso.

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  2. eu curti muito o viés "psicanalítico" da obra do Chaplin... e Chaves é sempre Chaves!

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