domingo, 24 de maio de 2009

A grande batalha [Frost/Nixon review]



Exatamente no dia 8 de agosto de 1974, o 37° presidente dos Estados Unidos anuncia sua renúncia em rede nacional. Nixon não sairia ileso de um possível impeachment, e por isso mesmo preferiu antecipar-se diante da iminente derrota. Supostamente envolvido no mundialmente conhecido Caso Watergate, o presidente estava encurralado pelas evidências, mas ainda assim negando qualquer participação no caso.

Para muitos, a renúncia não gerou nenhum alívio, pois não teve nenhuma admissão de culpa, nenhuma confissão e tampouco um pedido de desculpas à nação. Para o povo que ia às ruas para protestar contra a Guerra do Vietnã e seus desdobramentos, era como se Richard Nixon saísse pela porta dos fundos.


Ainda que tenha sido absolvido de possíveis crimes pelo então presidente, a sombra da corrupção iria para sempre desmoralizar a imagem pública do republicano que exalava prepotência. Certamente Watergate ecoaria para todo o sempre em qualquer lugar que estivesse.

Mas se havia alguma maneira de tentar melhorar sua imagem pública e ainda ganhar dinheiro, essa maneira era encarar o apresentador de TV David Frost. Nixon sabia que tinha grandes chances de manipular Frost - e certamente analisou que seria muito mais fácil encarar perguntas de um britânico considerado despreparado, do que duelar com um jornalista experiente.

Em maio de 1977, a série de entrevistas foi ao ar na TV americana, e traziam respostas precisas, para perguntas que até então não tinham respostas claras. Diante do imponente Nixon, estava Frost, que revelava não possuir convicções políticas e pensava apenas nos números que a tal entrevista poderia lhe dar. Ele entendia de televisão e estava mais para um showman do que para um jornalista. Mas o fato é que ao longo das entrevistas é perceptível que ele se transforma. Frost acaba compreendendo a importância daquele momento.

Talvez essa transformação tenha sido motivada por aspectos econômicos (tendo em vista que o próprio Frost bancou toda a entrevista), mas ainda assim eu prefiro acreditar que ele percebeu o quanto Nixon sabia jogar com as palavras e dominar situações adversas, e por isso, tenha decidido ir além da mera obviedade.

As cenas carregadas de closes demonstram com clareza todas as reações de ambos durante o duelo de perguntas e respostas. Confortavelmente sentados um em frente ao outro, sabiam muito bem que apenas um poderia vencer, e que era inevitável a desmoralização pública para o que saísse perdedor.

Neste tipo de história, até mesmo os momentos em que se contam os segundos para entrar no ar tornam-se cruciais. Trata-se de uma revisão histórica, e é isso que todos queriam ver. Sendo assim, aquele momento se tronou crucial para definir o futuro tanto de Frost quanto de Nixon.

Frost/Nixon revela-se uma excelente aula de jornalismo e é um grande exemplo de como a comunicação de massa pode transformar uma história, levar uma pessoa ao céu ou ao inferno apenas com um close. A TV não perdoa, capta cada movimento, cada gesto, cada gota de suor que escorre nos rostos. Cada take sugere algo, deixando escapar inquietudes e informações que muitas vezes vão além da fala, e transformam-se em revelações históricas.

O filme é genial em mostrar o desdobramento das entrevistas e tratar de temas tão espinhosos quanto Watergate e o governo Nixon. Os oponentes se colocam diante de holofotes, câmeras e produtores – raciocinam cada movimento, formulam réplicas e tréplicas. Ambos escolhem as palavras e analisam o momento certo de derrubar o oponente.

Em 1977, as entrevistas idealizadas por Frost varreram para sempre Nixon da política com a confissão de seus crimes. Naquele momento, o ex-presidente é derrotado diante das câmeras, e sua face revela toda a frustração diante do fracasso. O próprio Nixon disse que "não esperava nada mais desses filhos da puta chamados jornalistas”.

Podemos imaginar seu semblante no momento exato em que as luzes se apagaram no set, e ele teve que encarar o que viria em seguida: uma das maiores audiências não apenas nos Estados Unidos, mas também em todo o mundo.

Frost/Nixon mistura realidade com ficção, baseando-se nas entrevistas reais que David Frost realizou com Richard Nixon. Em alguns momentos os limites entre a ficção e a realidade lembram “A rainha” que deu o Oscar a Ellen Mirren (ambos os filmes contam com a participação de Peter Morgan). Cenas da TV se misturam com a brilhante interpretação dos atores que sustentam o filme com toda a dramaticidade e adrenalina que a história os permite explorar.

Em tempos de grandiosas produções carregadas de efeitos visuais, Frost/Nixon aborda um complexo assunto político com a firmeza de dois atores que se sentam em cadeiras confortáveis, um em frente ao outro. É a história contada em frente às câmeras e nos bastidores - a narração do episódio real que nos mostra como a comunicação pode, em poucos minutos, derrotar uma pessoa, até mesmo o prepotente e bem articulado Richard M. Nixon.

Frost/Nixon (Frost/Nixon)

Elenco: Frank Langella, Michael Sheen, Sam Rockwell, Toby Jones, Matthew MacFadyen.

Direção: Ron HowardGênero: Drama PolíticoDuração: 122 min.Distribuidora: Paramount Pictures


4 comentários:

  1. Muy buena entrada y acertada en sus comentarios.

    A mi me encantó la película, es básicamente una obra de teatro, ellos mismos fueron los que la pusieron sobre las tablas y se nota sus soltura con los personajes, estaban pegados a su piel.

    Un beso compañero

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  2. Vou pegar o seu filme emprestado com o Túlio e conferir essa aula de jornalismo, ok?

    ;**

    p.s.: O Frost parece ser gatinho, mas ainda quero um post sobre Friends!

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  3. Esse filme é fantástico. Resumiria-o numa frase: "O poder de um close."

    A entrevista é a matéria-prima para qualquer atividade jornalística, e a relação entre entrevistador e entrevistado é um campo repleto de complexidades, limites tênues e tensões...

    Acho que o desejo de todo jornalista é fazer uma entrevista que se torne a "empreitada de toda uma vida", nos moldes de Frost/Nixon.

    Ao assistir o filme, me deu vontade de ler "Hitchcock/Truffaut", que muitos dizem se tratar da mais importante entrevista de todos os tempos...

    esse assunto instiga! o filme é maravilhoso, em muitos momentos parecia que eu estava acompanhando um jogo de futebol... e estava torcendo para o jornalista, claro...

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  4. vou ser muitíssimo sincera... sim, eu adiei a leitura. -.- mas, foi bobeira, porque o texto ficou muitíssimo bom e deu muita vontade de assistir o filme.

    adoro essa alusão que se faz entre entrevistas e combates de vida ou morte. :D

    beeijo, afilhado. ;**

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