domingo, 29 de abril de 2012

Sim, eles estão nas ruas



Uma conversa no último sábado sobre os movimentos de ocupação de ruas e praças desencadeados após o estopim da Primavera Árabe, posteriormente a leitura de um artigo sobre o novo livro de Noam Chomsky, Ocuppy. Nesse meio tempo, me encontrei com jovens entusiastas de um movimento contra a corrupção em Goiânia e fotografias diversas de pessoas nas ruas, marchando e gritando palavras de ordem na urgência de que algo efetivamente mude - eu mesmo estive em uma dessas manifestações.

Me lembrei de quando estava em Toronto estudando as tensões entre o local e o global - matéria interessante, cheia de debates e discussões que norteiam o conceito de globalização. Lembro-me de em um determinado dia ouvir o professor dizer em um tutorial que "as manifestações que começaram a ocorrer localmente (em especial no Oriente Médio desde 2010) se tornariam verdadeiros movimentos globais", porque há algo de diferente no mundo: contexto de crise, redes sociais, classe média desnorteada .

Ele disse mais: "há uma urgência em mudar as coisas, pois não é possível continuar como está". Foram também naqueles dias que na mesma universidade em que eu estudei nasceu a Marcha das Vadias (Slutty Walk), seguido do Occupy Wall Street e outros movimentos que ganharam força naquele período. Eis o mundo em sua mais nova configuração, cheio de tensões interconectadas, fotografadas, gravadas e compartilhadas. Cheias de "likes" no Facebook.

Digo tudo isso para ressaltar que foi bom ouvi-lo dizer aquilo; foi bom ter pensado nisso enquanto eu acompanha as manifestações das últimas semanas. Há por aqui uma ampla articulação de jovens universitários, entidades de classe e população em geral - todos resolveram tomar as ruas em resposta a um grande escândalo político que está vindo a tona aos poucos, e varre praticamente todos os seguimentos da política estadual.

Quando me encontrei com alguns entusiastas da marcha, fiquei muito feliz e percebi que há um ambiente de reflexão e debate (apartidário) sendo criado em meio ao caos político. Isso é citado por Chomsky como um fator positivo do Occupy nos Estados Unidos, pois os jovens acabam criando comunidades, interagindo no mundo "real" e não apenas no campo virtual.



Naquela ocasião em que o professor dizia que novos movimentos se espelhariam no que estávamos vendo acontecer nos países árabes, eu estava cético, acreditando que a juventude brasileira dificilmente iria às ruas - os goianos então? Nunca! Mas vejo que ele estava certo, e aqui estou vendo a profecia se cumprir no coração do país, onde o tradicionalismo e os valores ainda são resguardados, e manifestantes e ativistas são chamados de baderneiros.


De dentro da mídia, reflito que o poder blinda o todo e não permite que esse mesmo movimento receba a atenção que merece. Mas ainda assim está crescendo, está nas redes sociais, nas imagens compartilhadas que viajam longas distâncias, nos vídeos caseiros feitos com iPhones e câmeras populares. Isso pode ser uma prova de que em tempo de bloggers e redes sociais, ninguém precisa tanto assim da mídia para se expressar.


Deixo abaixo a reflexão de Chomsky em relação à eficácia do Occupy: 


"
O Occupy eclodiu no momento em que era mais necessário, e acho sua estratégia brilhante. Se tivessem me perguntado, eu não a teria recomendado. Nunca pensei que fosse funcionar. Por sorte, eu estava errado. Funcionou muito bem. Dois grandes processos se deram, em minha opinião, e se puderem ser mantidos e ampliados, será extremamente importante. Um foi simplesmente mudar o discurso, colocando na agenda temas que estavam fervendo nos bastidores, mas nunca eram o foco principal – como a desigualdade, a corrupção financeira, a fragmentação do sistema democrático, o colapso da economia produtiva. Estes assuntos tornaram-se comuns. Isso foi muito importante.

Outro fenômeno que surgiu, e é difícil de medir, foi a criação de comunidades. As comunidades do Occupy foram extremamente valiosas. Formaram-se espontaneamente, com base no auxílio mútuo, intercâmbio público e outras coisas que fazem muita falta, em uma sociedade pulverizada como a nossa, onde as pessoas estão sozinhas. A unidade social por que o mundo dos negócios luta é apenas uma díade, um par. Você e sua televisão e seu computador. O Occupy quebrou isso de forma extremamente significante. A possibilidade de cooperação, solidariedade, apoio mútuo, discussão pública e participação democrática é um modelo que pode inspirar as pessoas. Muitas pessoas participaram disso, pelo menos de forma periférica."



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